A partir de um levantamento realizado pela Genera, com base em mais de 260 mil DNAs analisados, foi possível traçar um perfil genético da população brasileira, que diz muito sobre a ancestralidade de cada estado e região. Mas o que esse estudo aponta sobre o DNA do Rio de Janeiro? Continue a leitura para entender mais sobre as raízes ancestrais do povo fluminense.
Uma das primeiras regiões colonizadas pelos europeus
O estado do Rio de Janeiro foi uma das primeiras regiões exploradas e colonizadas pelos portugueses. Sua primeira exploração ocorreu entre os anos de 1501 e 1502. A tropa comandada pelo português Gonçalo Coelho encontrou a Baía de Guanabara no dia 1º de janeiro de 1502. No início, achavam que se tratava da foz de um grande rio e, por isso, a região recebeu o nome de “Rio de Janeiro”.
Já a segunda expedição, realizada em 1503, encontrou um recurso muito valioso: o pau brasil. Foi construída, então, na região conhecida hoje como Cabo Frio, uma feitoria para exportação do pau-brasil, que se tornou na época o principal recurso explorado em terras fluminenses.
A ocupação portuguesa do estado começou a ocorrer a partir de 1531, mas acabou não tendo muito sucesso nos anos iniciais devido à hostilidade dos povos originários que viviam na região: os tamoios e os goitacás.
Invasões francesas
Em 1555, algumas famílias indígenas fizeram uma aliança com a coroa francesa, permitindo que franceses estabelecessem uma colônia na Baía de Guanabara. Como resposta à invasão francesa, Portugal envia colonizadores para a e constrói São Sebastião, uma das cidades brasileiras mais antigas.
Em 1574, como estratégia para lidar com as invasões estrangeiras, Portugal dividiu o Brasil em dois governos, um sediado em Salvador, na Bahia, e o outro no Rio de Janeiro. A reunificação ocorre em 1578, ficando Salvador como capital brasileira. Entretanto, com a chegada da corte portuguesa em 1808, a cidade de Rio de Janeiro passou a ser a capital do Brasil até 1960, com a fundação de Brasília. Mas a cidade do Rio de Janeiro tornou-se o cartão postal do país, sendo reconhecida como a cidade brasileira mais conhecida no mundo.
Além das invasões francesas no início do período colonial, houveram outras tentativas desse país europeu em ocupar a região. O Rio de Janeiro também recebeu diversas outras influências da França ao longo de sua história, incluindo um grupo de artistas franceses que ofereceram seus serviços à corte portuguesa e fundaram a Escola Real de Ciências, Artes e Ofícios, que hoje é a Escola de Belas Artes, da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
No mesmo período, também chegaram na então capital, diversos navios com pessoas oriundas da França, em busca de uma vida melhor no Novo Mundo. Um censo realizado em 1911 pelo Ministério das Relações Exteriores da França contabilizava mais de 3.600 franceses vivendo no Rio de Janeiro naquele ano. A vinda de franceses para o Rio de Janeiro, especialmente junto à corte portuguesa, influenciou na arte, arquitetura, cultura, comércio e tradições da capital.
É interessante ressaltar que a Europa Ocidental, região que inclui a França, representa cerca de 18% do DNA da população do Rio de Janeiro, segundo levantamento da Genera. Já a Europa, de modo geral, corresponde a 70,21% do DNA fluminense, sendo a Ibéria a região europeia com maior representatividade.
Os povos originários que habitavam o Rio de Janeiro
Diversos estudos genéticos apontam que os povos originários da América descendem de populações da Sibéria que migraram à América do Norte entre 25 e 15 mil anos atrás, e dali ocuparam todo o continente americano, incluindo o território fluminense.
Em Niterói foi encontrado o Sambaqui da Lagoa de Itaipu, datado de 8 mil anos atrás. É um dos vestígios mais antigos da presença humana nessa região.
| Saiba mais: Como as linhagens indígenas das Américas chegaram no Brasil?
Em tempos históricos mais recentes, por volta dos primeiros mil anos da era cristã, os povos tupis da Amazônia ocuparam todo o litoral do Rio de Janeiro, exceto a região da foz do Rio Paraíba do Sul, que era habitada, assim como a região de Campos dos Goytacazes, pelos índios goitacás. Já o interior do estado era ocupado pelo povo puris. Quando os primeiros portugueses chegaram ao Rio de Janeiro, o litoral era habitado principalmente pelos povos tupis, especialmente das famílias tamoios e temiminós.
A resistência dos povos originários
Durante os primeiros anos de ocupação europeia no Rio de Janeiro, sucessivas batalhas ocorreram, especialmente entre 1567 e 1568, envolvendo portugueses, franceses e as populações indígenas.
Os indígenas que se aliavam aos portugueses eram recompensados pela Coroa, como aconteceu com Arariboia, que era líder da tribo dos temiminós. Ele recebeu, como recompensa, a área que hoje é a cidade de Niterói.
Contudo, foi por causa de conflitos do tipo, somados à transmissão de doenças endêmicas da Europa para as quais os indígenas não tinham imunidade, entre outros fatores, que os povos originários fossem praticamente dizimados do país.
Mas, ainda assim, os povos originários permanecem presentes na genética e ancestralidade da população fluminense. De acordo com levantamento da Genera, os povos originários da América correspondem a 5,56% do DNA dos habitantes do Rio de Janeiro, sendo Amazônia e América Andina os segmentos mais representativos.
A contribuição africana para a cultura do Rio de Janeiro
A partir da segunda metade do século XVI, o cultivo de cana-de-açúcar foi introduzido na Baía de Guanabara. A cana tornou-se a base da economia fluminense, cultivada em latifúndios e com emprego massivo de mão-de-obra escrava. Assim, chegaram ao Rio de Janeiro inúmeras pessoas de origem africana que foram escravizadas. Ao final do século XVII, haviam cerca de 120 engenhos de açúcar na região, o que, além da chegada de escravos africanos, também aumentou a imigração de portugueses para a região e seu desenvolvimento.
Já entre a segunda metade do século XIX e o início do século XX, o Rio de Janeiro tornou-se o epicentro da chegada de negros escravizados no Brasil, recebendo mais de 2 milhões de pessoas de origem africana.
Destino como esperança de melhores condições
Mesmo com o fim da escravidão no Brasil, em 1888, o Rio de Janeiro foi destino para muitas pessoas afrodescendentes, que buscavam na então capital do país melhores condições de vida. Ainda assim, vivendo às margens da civilização, essas pessoas que chegaram ao Rio de Janeiro não foram acolhidas e integradas na sociedade, e fundaram nos morros as primeiras favelas do país.
Consigo, os negros levaram muita de sua cultura e dos costumes dos terreiros, especialmente do estado da Bahia, para a cidade do Rio de Janeiro, e que se tornaram parte da cultura carioca. Entre esses costumes, o samba de roda baiano, que deu origem ao Samba, gênero musical que é a cara do Brasil.
| Leia também: O DNA dos ritmos brasileiros
Atualmente, segundo Censo de 2022, divulgado pelo IBGE, mais da metade (54,3%) da população da cidade do Rio de Janeiro considera-se preta ou parda, o que corresponde a aproximadamente 3,4 milhões de pessoas. Já em relação à ancestralidade genética, considerando as pessoas do estado do Rio de Janeiro que fizeram teste genético da Genera, o DNA do povo fluminense conta com uma média de 14,39% oriundos do continente africano.
Povos judeus no Rio de Janeiro?
Em 1496, pouco antes da descoberta do Brasil pelos portugueses, a coroa portuguesa ordenou a expulsão de seus territórios de todos os judeus que não se convertessem ao catolicismo. E, mesmo assim, os convertidos, chamados de cristãos-novos, sofriam certo desapreço e preconceito da população. A partir do povoamento do Brasil, muitos portugueses judeus e cristãos-novos vislumbravam no Novo Mundo uma oportunidade para reconstruírem suas vidas e partiram na missão de povoar o novo território.
Já a partir de 1810, quando a coroa portuguesa revogou a expulsão de judeus de seus territórios, muitos grupos imigrantes reconhecidamente judeus passaram a chegar no Brasil, especialmente em sua capital, Rio de Janeiro.
Além da capital, a cidade de Nilópolis, na Baixada Fluminense, também recebeu a comunidade judaica, formando uma grande colônia. Em grande parte, a comunidade judaica de Nilópolis foi formada por imigrantes de origem polonesa e russa, que pertencem ao grupo dos asquenazitas, o maior contigente de imigrantes judeus no Brasil.
Segundo o levantamento da Genera, o DNA do estado do Rio de Janeiro conta com uma média de cerca de 3% de origem judaica, sendo o segundo estado brasileiro com maior representatividade dessa ancestralidade.
As raízes ancestrais do povo fluminense
O levantamento da Genera revela as raízes ancestrais do povo fluminense, traçando o perfil genético do Rio de Janeiro desde as primeiras explorações portuguesas até os dias atuais.
Aliando os dados genéticos da população com o contexto histórico do estado, é possível se aprofundar no entendimento dessa narrativa complexa de formação da população fluminense. Destacam-se as influências europeias, indígenas e africanas que moldaram a identidade do estado, além de outros povos e etnias que contribuíram com a cultura, história e ancestralidade do Rio de Janeiro.
Da resistência dos povos originários à contribuição dos descendentes africanos na cultura carioca e chegada significativa dos imigrantes judeus no século XIX, o Rio de Janeiro se destaca como um caldeirão genético. Este estudo não apenas aprofunda nossa compreensão das origens genéticas, mas também enriquece a compreensão da história e identidade de todo o povo fluminense ao longo dos séculos.