Quando pensamos em fantasma, vem à nossa mente aquela visão aterrorizante de um vulto branco, carregando correntes ou até mesmo vagando em busca de pessoas para assustar. Sim, nesse caso estamos falando do conceito de fantasma muito explorado em filmes de terror e encontrado em fantasias de halloween. Porém, a ideia é um pouco diferente quando falamos em DNA fantasma, será que existe?
Neste outro contexto, o termo “fantasma” se aproxima do significado de “aparição de uma pessoa morta”, ou seja, o DNA fantasma seria uma forma de nosso DNA mostrar resquícios de uma população que não existe mais e que, até então, era desconhecida pelos cientistas.
Parece filme de ficção, mas, na verdade, isso é possível graças aos avanços dos estudos de genética das populações.
Nosso DNA e nossas origens
O nosso DNA é uma longa molécula que guarda muitas informações. Esses dados genéticos são capazes tanto de dar diretrizes às nossas células sobre quando e como se multiplicarem, possibilitando a construção do nosso corpo e nossas características; como também de armazenar um pouco da história do que ocorreu com nossos ancestrais.
Essa história pode ser contada através das variações genéticas que acumulamos com o passar dos anos, herdadas dos nossos pais. Podemos chamar esse acúmulo de memória genética, como se fosse uma forma do nosso DNA se lembrar do que aconteceu em outras gerações, na forma de um código. Esse código, por sua vez, não é tão fácil de ser desvendado, e a única forma de conseguirmos encontrar as peças que faltam desse quebra-cabeça é procurando por elas em várias pessoas de regiões diferentes.
Para isso, existem cientistas que analisam e comparam DNAs humanos, em busca de sinais que possam dar pistas sobre o passado. A partir dessas pistas, são criadas hipóteses que podem ou não ser provadas com a análise de fósseis e relatos históricos.
São com esses estudos que é possível descobrir as linhagens e as origens das pessoas, além de dar pistas acerca da evolução humana. Entretanto, esses estudos são relativamente recentes, embora estejam aumentando a cada dia. Alguns locais são mais estudados que outros e, por isso, apresentam dados mais precisos e específicos. Quanto mais estudos são feitos, mais conseguimos encontrar peças para desvendar a história dos seres humanos.
Sim, DNA fantasma existe!
Em janeiro deste ano, um grupo de pesquisadores da Universidade da Califórnia, nos Estados Unidos, conduziu estudos com as informações genéticas do continente africano publicamente disponíveis do Projeto 1000 Genomas. Ao analisarem esses DNAs, perceberam que cerca de 2 a 19% de suas sequências não correspondiam com as sequências e variações que tínhamos conhecimento até então. Isso significa que parte do DNA da África – em especial da porção Ocidental – tinha origem em um ancestral que, até então, nenhum cientista havia descoberto, apelidado carinhosamente de DNA fantasma.
O DNA fantasma existe e está principalmente presente nas populações atuais da África Ocidental. A teoria mais aceita é que uma “população fantasma”, da qual ainda não foram encontrados fósseis ou quaisquer resíduos de existência, viveu há meio milhão de anos na África e pode ter convivido e procriado com os primeiros humanos que habitaram o continente. Por algum motivo, essa população fantasma acabou sendo extinta, mas seu cruzamento contribuiu na formação do patrimônio genético das atuais populações do oeste da África.
Isso já aconteceu com outras populações, como os neandertais e denisovanos, mas esse novo DNA descoberto não possui associação com nenhuma destas espécies, o que sugere que esse antecessor antigo provavelmente se ramificou da nossa árvore genealógica antes da divisão dos neandertais e humanos modernos.
Como o DNA fantasma muda o que conhecíamos do nosso passado?
O DNA fantasma é um vestígio de um ramo extinto da ancestralidade humana que se esconde dentro do DNA dos africanos ocidentais modernos que evoluíram cerca de 500.000 anos atrás. Seu descobrimento acrescenta ao quebra-cabeça mais uma peça, indicando que humanos arcaicos conviviam com os primeiros seres humanos na África Ocidental.
Quanto mais avançamos no estudo de genética das populações, somado aos avanços da paleontologia e descoberta de novos fósseis, mais grupos desconhecidos serão encontrados, o que nos ajudará a entender melhor como o ser humano se desenvolveu.
“À medida que obtivermos mais dados de diversas populações — e dados de melhor qualidade —, nossa capacidade de filtrar esses dados e identificar essas populações fantasmas vai melhorar”, afirmou Sankararaman, biólogo que liderou a pesquisa que identificou que o DNA fantasma existe.